TCU
Controvérsia no TCU acerca da Interpretação do ART. 4º E DO ART. 20 DA EC Nº 103/2019
Jun 3, 2025
A Emenda Constitucional nº 103/2019, conhecida como Reforma da Previdência, trouxe profundas modificações nas regras de aposentadoria dos servidores públicos federais. Entre as diversas alterações, surgiu uma relevante controvérsia interpretativa entre o Tribunal de Contas da União (TCU) e o órgão central de pessoal do Poder Executivo Federal acerca dos artigos 4º e 20 da referida emenda.
O debate concentra-se na possibilidade de servidores com direito à integralidade e paridade optarem pela aposentadoria com proventos calculados pela média aritmética. Os artigos 4º e 20 estabelecem regras de transição para servidores que ingressaram no serviço público até a entrada em vigor da EC nº 103/2019, permitindo aposentadoria voluntária mediante o cumprimento de requisitos específicos.
No § 6º do art. 4º da EC nº 103/19, o dispositivo determina que:
Para servidores que ingressaram até 31/12/2003, os proventos corresponderão à totalidade da remuneração (integralidade), desde que tenham idade mínima de 52 anos (mulher) ou 62 anos (homem);
Para os demais servidores, os proventos serão calculados conforme o valor apurado na forma da lei (média aritmética);
O TCU adota interpretação restritiva, entendendo que os servidores enquadrados no inciso I do § 6º (com direito à integralidade) devem necessariamente se aposentar com proventos calculados sob essa regra, sem a possibilidade de optar pelo cálculo da média aritmética.
Em contrapartida, com a publicação da Portaria SGP/SEDGG/ME nº 10.360, de 6 de dezembro de 2022, o órgão central de pessoal do Executivo entendeu que os servidores podem escolher a forma de cálculo mais vantajosa, permitindo que mesmo aqueles com direito à integralidade possam optar pela média aritmética quando esta resultar em valor superior ou quando preferirem o modelo de reajuste anual em detrimento da paridade.
Dois fatores principais podem levar servidores a preferirem a média aritmética:
Em determinados casos, o cálculo pela média pode resultar em valor superior à última remuneração;
Os benefícios calculados pela média são atualizados anualmente, enquanto os calculados pela integralidade dependem de reajustes concedidos aos servidores ativos (paridade);
Servidores com mais de 40 anos de contribuição podem receber proventos acima de 100% da média.
A interpretação restritiva do TCU pode ser contestada com base no princípio do melhor benefício, historicamente assegurado pela Constituição e pela legislação previdenciária. Este princípio garante ao servidor o direito ao melhor benefício. E, nesse contexto, descabe a compreensão do TCU a respeito da irrenunciabilidade do direito a integralidade e paridade por parte do servidor público.
Ademais, a Constituição deve ser interpretada de forma sistemática, em consonância com os princípios e valores fundamentais do Estado Democrático de Direito. A redação imprecisa do dispositivo abre margem para interpretações diversas, contudo, deve prevalecer aquela mais favorável aos servidores.
Diante deste cenário controverso, recomenda-se ao servidor que pretende se aposentar:
Avaliar todas as possibilidades disponíveis, verificando outras regras de aposentadoria potencialmente mais vantajosas;
Realizar análise comparativa, calculando o valor do benefício pelas diferentes metodologias;
Considerar não apenas o valor inicial, mas também a forma de reajuste ao longo do tempo;
Buscar orientação jurídica especializada para fundamentar adequadamente seu pedido de aposentadoria.
Caso opte pela fundamentação do art. 4º ou do art. 20, com cálculo pela média, o servidor deve estar ciente dos possíveis efeitos de eventual decisão desfavorável do TCU e que, necessariamente, para sustentar tal fundamentação, deverá acionar o Poder Judiciário.
A controvérsia interpretativa sobre o art. 4º e o art. 20 da EC nº 103/2019 evidencia a necessidade de uma hermenêutica constitucional que privilegie os direitos fundamentais e o princípio do melhor benefício. A posição restritiva do TCU merece ser questionada à luz de uma interpretação sistemática da Constituição e dos princípios que regem o direito previdenciário.
Em última análise, trata-se de garantir que o servidor tenha acesso ao benefício mais vantajoso, respeitando-se sua autonomia e direito de escolha dentro das possibilidades legalmente previstas, assegurando tanto a segurança jurídica quanto a proteção previdenciária adequada.
Por fim, seguem links para acessar duas decisões do TCU a respeito do art. 4º e do art. 20 da EC nº 103/19 que julgaram ilegais o cálculo dos proventos pela média aritmética de servidores que ingressaram no serviço público até 31/12/2023: Acórdão 10375/2024 - Primeira Câmara do TCU e ACÓRDÃO 2040/2024 - SEGUNDA CÂMARA.

